31 de maio de 2020

"Não consigo respirar"- Até quando seremos omissos?




Por Everton Edvaldo

Nos últimos dias, viralizou pelo mundo o caso do assassinato do negro Gerge Floyd por um policial. Novamente, a pauta sobre o racismo voltou a estar em alta. Os extremismos logo começaram: vários negros revoltados e indignados destruíram e queimaram lojas, carros, dentre outras coisas. Nesse ínterim, a ala mais política e ideológica reaparece no cenário com mais força para implantar suas bandeiras. Esse não foi o primeiro caso de racismo, nem será o último, lamentavelmente, mas o meu texto é para lidar com uma coisa ainda mais grave: a omissão daqueles que se dizem ortodoxos, conservadores e bíblicos.

Em primeiro lugar, não é verdade que todos que são conservadores são omissos quanto a isso, existe um remanescente dentro desse nicho que tenta conscientizar os demais da importância desse tema. Mas esse remanescente é muito pequeno e inexpressivo e muitas vezes, é “sufocado” ou ignorado pela massa.

Em segundo lugar, o Cristianismo ainda nos dias de hoje tem deixado a desejar na forma como se relaciona com as questões sociais. Com exceção de alguns avanços que foram feitos historicamente nesses últimos 2000 anos, boa parte da preocupação dos cristãos até o século XVIII era com questões espirituais. Os poucos que ascenderam à status sociais, subiram ao poder e podendo fazer algo por causas justas, pouco fizeram, ou não fizeram nada. Obviamente, questões espirituais são importantes, mas estas não anulam as questões sociais que são implicações práticas da mesma. Por exemplo, a questão da escravidão foi discutida de forma efetiva tardiamente na história da igreja. É nos dias de John Wesley com sua luta abolicionista que as coisas começam a mudar. Várias outras questões como o papel da mulher na igreja e na sociedade foram simplesmente ignoradas e omitidas por muitos, e essa postura de se isentar dos problemas alimentou movimentos revolucionários, progressistas, feministas e ideológicos.

Em terceiro lugar, quem disse que para defender causas sociais eu preciso ser adepto de hermenêuticas sociais ou de ideologias políticas que não são conservadoras (como o esquerdismo, por exemplo)? É justamente por conta da nossa omissão que esses grupos crescem, ganham voz e espaço. Se nós estivéssemos cortando a nossa grama de forma efetiva, talvez o nosso quintal não estivesse tão entulhado. Sim meus amigos, um dos grandes responsáveis pela proliferação e captação de cristãos por esses movimentos mais reacionários são os próprios cristãos ditos conservadores que ao invés de tratar o problema à altura, terceiriza de forma indireta sua responsabilidade. Rotular, censurar e ser intolerante com esses grupos além de ser a forma mais estratégica de promove-los, viabiliza munições para que eles tenham sucesso em suas agendas.

Em quarto lugar, a pauta do oprimido, é uma pauta bíblica. Não é porque um cristão de esquerda a toma para si que faz dela menos bíblica. Obviamente, eu discordo da leitura que é feita por esse movimento, mas isso não faz da pauta menos importante. A pauta da injustiça social ou da desigualdade é real, e antes de ser de esquerda ou de direita, ela é um grito da humanidade, grito este já dado por muitos daqueles personagens que fizeram parte da Bíblia como os pobres, oprimidos, órfãos, mulheres, viúvas, estrangeiros, a quem Deus tanto amou, acolheu e amparou.

Em quinto lugar, o que aconteceu com George Floyd não está muito distante da nossa realidade. Nossas igrejas estão cheias de pessoas que não conseguem mais respirar, elas não aguentam mais! A omissão da igreja brasileira em muitos aspectos, contribui para que mais e mais pessoas sejam torturadas até a ‘morte’ (algumas físicas, inclusive). Por exemplo:

“Não consigo respirar” é o grito do casal de adolescentes que infelizmente, não tendo do seu pastor uma orientação sexual, um trabalho de mentoria/ instrução, cairá em fornicação, e será obrigado pela igreja a casar, não recebendo nenhum suporte e empurrando com a barriga um casamento que potencialmente já vai começar destruído.

“Não consigo respirar” é o grito da mulher que é agredida e violentada pelo esposo cristão e que quando busca ajuda na igreja, recebe o conselho de líderes e outras irmãs para orar por ele, ao invés de denunciar.

“Não consigo respirar” é o grito da pessoa que é cristã/salva que está passando por depressão que receberá reações de irmãos da igreja do tipo “isso é frescura,” “depois passa”, “isso é opressão demoníaca, vamos orar” e que se vier a cometer suicídio, ainda será julgada como alguém que não era cristã e que foi para o inferno.

“Não consigo respirar” é o grito das crianças que são abusadas por líderes/pastores de igrejas e até por pais cristãos, grito esse que muitas vezes é abafado pela instituição.

“Não consigo respirar” é o grito daquela pessoa que é cristã e que está lutando contra desejos homoafetivos e que será discriminada por seu jeito fora do padrão “heterossexual.”

“Não consigo respirar” é o grito daquele pai família cristão que dizima há 10 anos, mas que quando está desempregado, passando necessidade, a igreja simplesmente ignora e se brincar, ainda liga ‘cobrando’ o dízimo do mês.

“Não consigo respirar” é o grito daquela família que na igreja se comporta como se tudo estivesse bem, mas dentro de casa, vive um verdadeiro inferno.

“Não consigo respirar” é o grito daquela mulher que se for traída e pedir divórcio, será discriminada pela igreja.

Enfim, “não consigo respirar” não é somente o grito de um negro, é um grito de todos, é um grito de socorro que representa uma parcela de pessoas que estão simplesmente tendo seus problemas ignorados pela igreja contemporânea. Oro a Deus para que isso mude logo!

9 de maio de 2020

Afinal, Deus está ou não no controle de todas as coisas? Uma resposta a John Piper e Victor Azevedo


Por Everton Edvaldo

É comum em meio à qualquer caos (como guerras, pandemias, massacres terroristas), o tema da teodicéia ficar em alta. Afinal, se Deus é bom e todo poderoso, porque ele não acaba com o mal? Ou porque ele permite que pessoas de bem, sofram? Interessados nisso, muitos cristãos passam e estruturar suas próprias respostas para um problema que é dificílimo de responder, porque qualquer resposta não esgota a temática. Essa semana, em meio à Pandemia do COVID-19, fomos bombardeados por duas declarações extremas. 

A primeira de um teólogo cristão, sério e comprometido com a Palavra de Deus: John Piper. Para John Piper (que é calvinista), Deus controla tudo, a ponto de decretar todas as coisas (incluindo o mal), logo, até o Corona Vírus foi enviado por Deus. Não é de hoje que afirmações como essas, tem beirado a uma crença heterodoxa antiga chamada fatalismo. 

O fatalismo foi uma filosofia greco-romana segundo a qual todos acontecimentos são fixados com antecedência pelo destino. No Cristianismo, ele ganhou uma nova roupagem através de algumas figuras cristãs como Agostinho até os dias da reforma (com Calvino).

 No Calvinismo, a mão de Deus está em todas as coisas, a ponto de um Calvinista como Francisco Gomaro afirmar: "Deus move as línguas dos homens para blasfemar." Mas voltando ao caso de John Piper, não é a primeira vez que ele faz declarações desse tipo, em meio ao luto gritante do ataque terrorista à torres gêmeas em 2001, (que matou mais de 2.000 pessoas), ele chegou a dizer que foi Deus quem enviou o avião em direção às torres gêmeas, quando afirmou que o evento foi decretado por Deus. 

O que há de errado com a frase do Piper? Piper faz afirmações com base em passagens mal compreendidas das Escrituras.  É bem verdade que embora a Bíblia fale de decreto, determinação e do controle de Deus, não podemos concluir com isso que todas e cada uma das coisas sejam meticulosamente fixadas por Ele, muito menos concluir arbitrariamente a partir das passagens que falam do juízo de Deus sobre nações, que qualquer tragédia na humanidade, tenha o 'dedinho de Deus.'

 Por outro lado, nesses dias, tivemos uma declaração tão digna de repreensão quanto a do Piper. Foi dita por um influencer gospel chamado Victor Azevedo. Este jovem, que há um bom tempo tem blasfemado de Deus e mostrado seu descompromisso com a Bíblia, fez uma declaração desconfortante: Deus não está no controle de todas as coisas, logo, Ele não tem nada a ver com o COVID-19.Esta declaração também não é nova no mundo cristão, pois já aparece como um desdobramento da teologia do teísmo aberto. 

Ela também não se encaixa com a Bíblia, pois ela é clara em dizer que Deus governa, controla e é soberano. A verdade é que a Bíblia garante sim que Deus está no controle de tudo, mas não no retrato apresentado pelo Calvinismo. Deus não precisa decretar meticulosamente todas as coisas para ser soberano. 

Ele é Rei e SENHOR, inclusive sobre o mal e sobre o COVID-19, quer permitindo-o, quer enviando-o. O SENHOR continua no trono e de lá, ninguém lhe tira.