30 de julho de 2018

Entrevista exclusiva com o Pastor Artur Eduardo




Por Everton Edvaldo

A nossa entrevista hoje é com o Pastor Artur Eduardo. Graduado em Teologia e Filosofia. Pós graduado em Doc. do Ensino Superior, Teologia Bíblica e Psicopedagogia (FATIN). Mestre em Filosofia (Univ. Federal de Pernambuco). Doutorando em Filosofia (Univ. Federal de Pernambuco). Diretor do IALTH (Inst. Aliança de Linguística, Teologia e Humanidades). Pastor da IEVCA (Igreja Ev. Aliança). Casado com Patrícia, com quem tem uma filha, Daniella.


01) Pastor Artur, ao longo dos anos, o senhor tem batalhado para levar a qualidade do ensino bíblico para diversas classes de pessoas, mas conte-nos, como foi a sua experiência com a Bíblia. Quando começou o interesse pelo estudo das Escrituras e o que levou o senhor, a investir na área da educação cristã?

R – O interesse, na verdade, vem desde que eu me lembro de quando sou convertido à fé cristã. Tornei-me professor de formação teológica em 1998, cerca de 2 anos antes de me tornar pastor, no ano 2000. Depois de lecionar em alguns seminários e faculdades no Grande Recife, o Senhor Deus nos orientou a fundar o IALTH – Instituto Aliança de Linguística, Teologia e Humanidades, que tem crescido e se fortalecido na região. No IALTH temos podido implementar melhor nossa visão acerca da educação teológica, filosófica e das humanidades, aliando o viés ministerial ao acadêmico.

02) Há mais de 20 anos, o senhor tem lidado com milhares de alunos, das mais variadas igrejas e crenças, de modo que acumulou ao longo dos anos, um vasto conhecimento sobre o perfil geral dos alunos. Sendo assim, nos responda: quais os perfis, motivações e expectativas dos alunos que entram num Seminário hoje?

R – É muito diferente, hoje, de há 20, 30 anos. Lembro-me que quando fiz seminário, na década de 90, a quase totalidade dos alunos era composta de pessoas com ciência de uma vocação ministerial. Eram menos cursos: havia o de bacharel em teologia, o de missiologia e o de educação religiosa. Normalmente, eram esses três nos seminários. As pessoas que estudavam, tinham aspirações eclesiais em áreas nas quais era exigida a formação em um dos tais. Hoje, vemos alunos destes e de outros cursos que surgiram ao longo dos anos, que estão fazendo para aumentarem conhecimento, por uma questão de complementação de formação. Há os que também fazem por vocação ministerial, mas posso lhe assegurar que são bem menos do que há anos. O perfil do aluno de teologia, de um modo geral, mudou. 

03) Todos nós sabemos que cada momento da história da igreja, teve seus próprios desafios tanto no âmbito intra-eclesiástico quanto no extra-eclesiástico. Desafios, que por vezes, tiraram o sossego de muitos homens de Deus. Que tipo de desafios, um teólogo do século XXI enfrenta, e de que forma, ele pode lidar com eles.

R – Muitos. Temos “teologias”, se é que podemos chamá-las assim, que são verdadeiros desafios à fé cristã conservadora e à teologia ortodoxa. Temos “teologias feminista, negra, gay”, as muitas formas de “evangelho social” (esquerdismo evangélico) e outros movimentos supostamente acadêmicos, no âmbito eclesiástico, cujo intento principal não é outro senão seu próprio nicho ideológico. Concomitantemente, temos observado uma grande apatia em relação à massa da Igreja, quanto à teologia. As pessoas acham “bonito” esse ou aquele aspecto teológico, mas a tendência é não se interessarem seriamente por questões teológicas, preocupando-se, no mais das vezes, com aspectos mais triviais da fé. Isto é muito ruim, porque as principais doutrinas não são bem compreendidas pela grande maioria dos cristãos, hoje, que tende por conseguinte a viver uma vida espiritual puramente intuitiva, baseada naquilo que se consolida em sua experiência de fé e espiritualidade, confundindo isso com o cristianismo e a própria vontade de Deus. De igual forma, temos também uma crescente tensão entre aspectos dogmáticos da fé cristã que se opõem em confrontos, ora velados, ora mais abertos. Isso mostra que estamos longe de termos uma unidade teológica, porque lá atrás no tempo, as fissuras que resultariam nos movimentos eclesiais que vemos hoje não foram fechadas, pelo contrário, foram abertas, expostas e muito malcuidadas pela Igreja. O resultado são alas do evangelicalismo mundial disputando entre si o status de “ortodoxo”, às vezes mais baseadas em ícones de seus próprios movimentos do que na fé bíblica que alegam defender.

04) Atuando também na área da Filosofia, certamente o senhor já ouviu dizer que "um teólogo não precisa ter um conhecimento de Filosofia para ser um bom teólogo." Isso é verdade ou uma falácia? Qual a importância da Filosofia para os estudos teológicos e em que momento, ela anda junto com as principais disciplinas de um estudante de Teologia?

R – Quanto à primeira pergunta, é uma falácia. Quanto à segunda, a resposta é muito simples: ninguém pode falar nada sobre algo como arbítrio e determinismo, por exemplo, sem as devidas considerações acerca de todos as nuances que algo como esses temas envolvem. E quanto a nuances, refiro-me aos aspectos morais, lógicos e teológicos que assuntos como aquele suscitam. Esta reflexão, em si, é filosófica. A filosofia lida e auxilia a teologia com esses temas, uma vez que impele a razão a desdobramentos que, do contrário, não seriam possíveis. Raciocinar e deduzir que não é necessário filosofia é, em si, o uso da filosofia!! Observou? Até para excluí-la da atividade teológica, deve-se usá-la.

05) A Teologia é um campo vasto, que pode ser explorada em seus diversos aspectos. Por exemplo, existem obras  de Teologia Histórica, Introdução à Teologia, Teologia Bíblica, e por aí vai... Queremos saber do senhor, qual ou quais as diferenças básicas entre Teologia Bíblica e Teologia Sistemática e qual o espaço, papel e importância que cada uma ocupa dentro do contexto cristão.

R – A teologia bíblica, grosso modo, é aquela que se relaciona diretamente aos livros ou excertos bíblicos. É claro que o livro de Salmos, por exemplo, contém aspectos teológicos gerais, uma vez que, por mais diferentes que sejam, os salmos têm algo mais forte que os une, do que o que os separa; caso contrário não estariam agrupados num mesmo livro. Mas, sabe-se, por exemplo, que há grupos de salmos mais iguais entre si. É por isso que os teólogos dividem o livro de salmos em livros menores, com grupos de salmos que compartilham algumas características mais notáveis. Quando falamos de uma teologia bíblica do livro de Salmos, temos de levar em consideração os temas e semelhanças linguísticas e literárias desses grupos menores, o que, quando feito, nos dá um quadro mais abrangente da teologia do livro de Salmos. Isto é, de modo geral, a teologia bíblica. O mesmo pode ser feito com todos os livros da Bíblia. Por exemplo: por que há quatro evangelhos canônicos, sendo que três são “sinóticos” (“semelhantes”): Marcos, Mateus e Lucas? Por que, mesmo sinóticos, os evangelhos contêm diferenças? É óbvio há algo mais do que a mera personalidade literária de cada autor. Há uma teologia própria de cada livro, com suas especificidades que lhe são próprias.

Em relação à teologia sistemática, podemos dizer que é um determinado agrupamento de temas bíblicos, que são dispostos e trabalhados por teólogos, cujo intuito é formar um panorama abrangente de como a Bíblia fala sobre os mesmos, os quais são cruciais à fé teísta. Temas como a doutrina de Deus, de Cristo, do Espírito Santo, da Igreja, o homem, do pecado, dos anjos e demônios, do fim etc. Teologia sistemática lida com temas bíblicos. Teologia bíblica lida com as teologias dos livros da Bíblia.

06) Numa época em que o cristianismo tem sido confrontado por ideologias satânicas, imorais e insanas, a Apologética deveria ocupar um papel importante na vida do cristão. Entretanto, a realidade tem sido outra, pois, poucos cristãos estão preparados para fazer essa defesa consistente do cristianismo fora dos âmbitos eclesiásticos. Pela experiência que o senhor tem nessa área, quais apologistas que têm lutado para mudar esse quadro, o senhor indica para nós e que são influentes e respeitados não só no ambiente acadêmico-teológico, mas também no acadêmico-secular?

R – A lista é razoavelmente grande, pois há dois mil anos que há apologistas na Igreja, lutando cada um suas respectivas lutas, atreladas aos seus tempos. Desde os primeiros “apologistas” patrísticos, nos primeiros séculos da Igreja, aos trabalhos de teologia, filosofia e teologia natural de nomes medievais, todos deveriam ser estudados no âmbito acadêmico eclesiástico. Infelizmente, são nomes em grande parte desconhecidos do público evangelical, de um modo geral. Não é à toa que muitos desses são estudados nos centros de filosofia mundo afora, e são respeitados como filósofos, pois seu trabalho gerou importantes contribuições à história das ideias. O curioso é que estes homens, em particular, criaram suas obras “filosóficas” à luz da teologia, e normalmente aquelas contribuições filosóficas são eminentemente cristãs. Por isso, creio que nomes como Agostinho, Boécio, Anselmo, Duns Scottus, Tomás de Aquino, Scotus Erígena e Guilherme de Ockam são fundamentais para quem quer estudar os temas abordados em apologética.

Nas eras moderna e contemporânea, nós temos nomes de peso, que vieram da academia e nos legaram suas contribuições. É impossível você falar de apologética cristã no período moderno sem mencionar Lutero e o momento de ruptura em que ele viveu. O pensamento de Lutero, cristalizado em seus escritos, revela-nos bem um aspecto da apologética cristã que se levantou contra os desvarios romanos, aceitos como se fossem revelações bíblicas. A partir daí, temos inúmeros homens que deixaram valiosas contribuições à apologética, às vezes em áreas muito específicas, mas não menos importantes. Leibniz foi um desses homens. Cito Leibniz pela sua tentativa de explicar a justiça de Deus, relacionando-a com o mal no mundo e a pergunta sobre se esse mundo é de fato o melhor mundo possível. Seu livro “Teodiceia” é um marco para a apologética cristã, ainda que não se concorde com todas as ideias do filósofo. Em tempos mais recentes, temos nomes de peso no cenário acadêmico mundial, como Josh McDowell, Ravi Zacarias, J. P. Moreland, Peter Bochino, Dinesh D´Souza (católico) e mais atuante em história e política, Michel Lincona, Alister McGrath, Norman Geisler, Paul Copan, Frank Turek, Gary Habermas e William L. Craig. Todos com grandes contribuições apologéticas nas áreas de história, filosofia da religião e teologia.

07) Nos últimos anos, muitos cristãos se interessaram pelo debate soteriológico que foca nas questões relacionadas com a Mecânica da Salvação, Providência Divina, Livre-Arbítrio, etc. Embora não se resuma a isso, a massa dos cristãos se define como Calvinistas e Arminianos. Nesse meio, outro grupo tem ganhado espaço, crescido e se destacado por suas explicações sofisticadas e bem fundamentadas, inclusive o senhor faz parte dele; são os Molinistas. Baseado nisso, queremos saber o porquê o senhor se define como Molinista e porquê a maioria dos que se definem como Molinistas são Filósofos ou têm interesse por ela?

R – Antes de responder, é preciso ressaltar que calvinistas e arminianos têm suas linhas norteadoras de pensamento que, querendo eles ou não, moldam e guiam suas perspectivas bíblicas. O grande desafio, para calvinistas, arminianos e molinistas, é desvencilhar as linhas de pensamento que seguem dos homens que lhes emprestaram seus nomes: Calvino, Armínio e Molina. É por isso que, particularmente, não gosto destes rótulos e os uso mais por efeito didático do que por qualquer outro motivo, embora veja, com pesar, como o partidarismo soteriológico é emotivo e segregador em nosso meio. Dito isso, penso ser o molinismo uma melhor explicação quanto ao processo da “mecânica da salvação”, uma vez que se destaca por apresentar, a partir da Escritura, uma série de deduções sobre Deus que fazem sentido, ante problemas que se nos parecem insolúveis nos outros sistemas soteriológicos.

No calvinismo, por exemplo, se aceitarmos que Deus é soberano como nos moldes que foram apresentados por Calvino, então temos uma série de problemas incontornáveis: Deus é o autor do mal (e quando dizem os calvinistas que não é, afirmam que Deus decretou que o homem livremente escolhesse pecar, o que é um contrassenso); Deus decide quais homens vão incondicionalmente ao céu ou ao inferno, para sempre, repassando-nos a ideia de uma arbitrariedade que, quando questionada, esquiva-se para o “inefável”, o “inescrutável”, o “inalcançável”.

No arminianismo, temos uma linha de destino, que é a que Deus previu e a partir da qual ele decidiu um monte de coisas, inclusive a salvação de quem ele sabia que iria crer no Evangelho. Ok. A grande questão é que, neste sistema, se tudo é exclusivamente em função da absoluta presciência simples de Deus, então ele faz as coisas porque previu e, portanto, o “futuro causa o passado”, o que se apresenta também como um problema obscuro e incontornável.

Na proposta molinista, que leva o nome do padre jesuíta do século XVI, Luís de Molina, há uma tentativa (filosófica e teológica) de concordância dos aspectos aparentemente inconciliáveis do livre-arbítrio e da predestinação divina. As bases formais estruturais estão lançadas em um livro de 1588, intitulado “Liberi arbitrii cum gratiae donis, divina praescientia, providentia, praedestinatione et reprobatione concordia”  ou como é mais comumente conhecido, “Concórdia”. Neste livro, Luis de Molina nos mostra a sua ideia do conhecimento de Deus a partir de uma divisão lógica. É a dinâmica molinista da onisciência de Deus, seu sumo poder e a liberdade humana, que se constitui um avanço formidável no entendimento da “harmonia” (“concórdia”) entre a ação livre do homem em consonância com a soberania divina.

É, no meu ponto de vista, uma percepção sofisticada porque, além de preservar a liberdade humana, base de sua racionalidade, entende que Deus como conhecedor de todas as possibilidade factíveis (denominadas contrafactuais), atualiza ou estabelece aquelas em que a liberdade humana coaduna-se da melhor forma possível ao ponto em que a vontade de Deus se cumpra e o maior presente dado ao homem não seja violado, ou seja, seu livre-arbítrio.

08) Temos acompanhado diariamente a adesão de cristãos por interpretações que não se coadunam com as doutrinas bíblicas. Entre essas interpretações, temos duas que estão em ascensão: calvinismo e cessacionismo. Boa parte dessa adesão se dá por cristãos que não tem acesso aos conhecimentos básicos de hermenêutica e de exegese e que são influenciados pelas redes sociais e por teólogos que tendo a “aparência de erudição” acabam convencendo esse tipo de público. Como o senhor enxerga tudo isso? Calvinismo e cessacionismo são interpretações nocivas para o cristianismo? Qual o impacto da crença nessas duas interpretações para uma congregação, por exemplo?

R – Somos  um povo passional e é normal que defendamos as posições que nos são atraentes de maneira apaixonada. Isto é de certa forma comum nos povos latinos. Contudo, aqui, não quero que minhas posições sejam interpretadas pelo viés da pessoalidade. Nada tenho contra calvinistas e tenho bons amigos que o são. Destarte, penso que o calvinismo é um sistema que, por destoar muito do que diz a Bíblia, pode sim ser nocivo, se as pessoas que o defendem não compreenderem que o que se chama “calvinismo” é UMA forma de interpretação de vários aspectos da teologia bíblica, a partir principalmente da ótica do reformador genebrino João Calvino, e não o evangelho em si.

     A dinâmica da teologia calvinista, que é baseada em uma aspecto federal, ou seja, de aliança, é complicado, pois para que funcione no período da Igreja, algo teria de substituir o selo da aliança veterotestamentária, que é a circuncisão, e os calvinistas, encontram no batismo este selo. Como um selo da nova aliança, o batismo é visto como “sacramento” e, portanto, decisivo no processo salvífico. Não estou dizendo que os calvinistas defendem que o batismo salva, mas é exatamente por isso que os calvinistas batizam crianças, pois é um modo de fazer o infante ingressar na promessa do Novo Pacto, a partir de Cristo.

     A mecânica da salvação calvinista também é complicada, pois, como já disse, Deus acaba por se tornar o autor do mal e, portanto, pior do que o Diabo, uma vez que é ele que – segundo os calvinistas -, guia a as ações dos homens, boas ou más, afim de que as mesmas adequem-se a um “decreto inescrutável” de Deus; onde o mesmo ordena as ações dos homens, boas ou más, e é responsável apenas pelas boas, enquanto estes são responsáveis pelas más. Isto é inaceitável, não apenas porque é realmente um malabarismo muito grande para se evidenciar a soberania de um Deus que está no controle do universo, mas principalmente porque não é isso que a Escritura sugere ou explicita. “A alma que pecar, essa morrerá”, diz-nos o profeta Ezequiel (18:20-24), em um contexto onde os sacerdotes e sábios de Israel, no exílio babilônico, deveriam aprender que o homem é responsável por seus atos perante Deus, como aquela geração, que estava sendo castigada por seus próprios pecados, os quais superavam os de seus antepassados ou, no máximo, perpetuavam-se naqueles.

     O cessacionismo é um engodo, um engano, algo de muito, muito nocivo para a Igreja como um todo. Os dons espirituais são um modo de a multiforme sabedoria de Deus revelar-se ante o mundo, através da Igreja. São sinais que nos remetem a um Reino espiritual, que se mostra real, ainda que desconhecido da maioria dos homens. É a ação do Espírito Santo na Igreja que a mantém viva e atuante em um mundo que clama pelas trevas do caos e do abandono de Deus. Retirar da Igreja os dons, atrelando-os exclusivamente ao passado, é tornar a Igreja manca e suscetível a ações espirituais malignas, além da secularização e acomodação aos valores culturais que vemos hoje, na sociedade, muitos dos quais são francamente antibíblicos. Não é de admirar que seja no seio de muitas igrejas cessacionistas, onde vemos sinais de apostasia espiritual e prática, há séculos. Estas igrejas mantêm-se em pé por causa de tradição, mas espiritualmente estão mortas, com práticas abomináveis à luz da Escritura. É delas que vêm a liberalização do homossexualismo, a aceitação de clérigos gays, o aumento do feminismo e inclusive a defesa do aborto, etc. Não é admirar que o evangelho tenha praticamente morrido na Europa, no contexto das igrejas históricas, muitas delas cessacionistas.

09) Agora, saindo um pouco do contexto teológico, queríamos saber qual a visão que o senhor tem acerca do cenário político do Brasil?

R – O pior. O Brasil é um país, cuja situação política é sui generis: acostumamo-nos com a corrupção, ao mesmo tempo em que expomos, denunciamos e nos horrorizamos com a mesma. Como assim? Como podemos ser tão complacentes com homens e mulheres corruptos, com políticos que, respondendo processos ou condenados, têm contra si milhares de evidências de suas transações sujas, seu legado maldito, cujo rombo nos cofres públicos é causador direto de cortes de serviços públicos essenciais, que por não existirem, ceifam as vidas de milhares de Brasileiros anualmente? Como podemos levar a sério a classe política no Brasil, para o que quer que seja? Mesmo assim, levamos. E seguimos, como se não nos acontecesse nada.

10) Como o senhor vê a recente legalização do aborto em alguns países, e a aprovação de casamento entre pessoas do mesmo sexo dentro das igrejas?

R – O resultado natural de décadas de influência anticristã no mundo. O aborto é um caso de classificação seletiva: por “vida”, entende-se tudo o que possui processos biológicos autônomos. Assim, ovos de tartaruga marinha contêm vida e mulheres em gestação aos 2, 3, 4 meses também. A questão é a mudança de percepção do status da vida. Em relação aos ovos de tartaruga, que contêm uma tartaruga marinha em potencial, as quais estão ameaçadas de extinção, um ativista esquerdista, por exemplo, defender com todas as forças a preservação daqueles ovos, enquanto poderá fazer piquetes, vigílias e protestos diversos pela liberação do aborto. O status desta vida, a humana, é inferior ao daquela, a reptiliana. Não é à toa que, em tempos de ecorreligião, haja pessoas “se casando com a terra” e, para posturas menos radicais, vejamos governos promovendo a proteção de “santuários” naturais, onde ninguém pode pescar um peixe, enquanto seres humanos morrem à espera de tratamento em filas de hospitais que caem aos pedaços. 

O caso dos homossexuais é o mesmo. A lógica que defende esse movimento, o LGBT, é a mesma que o vê como um veículo de desconstrução. O que se tenta desconstruir? Os paradigmas que construíram a civilização ocidental. E tais paradigmas passam pela cosmovisão judaico-cristã. Esta é baseada na confirmação dos preceitos bíblicos, os quais mantêm um código de liberdade civil institucional intrínseca à própria mensagem do evangelho. Todos  os países genuinamente cristãos defendem a liberdade civil, com os direitos essenciais preconizados na Bíblia, assegurados nas constituições dos mesmos, que normalmente são repúblicas federativas. Tais repúblicas são o resultado direto da ideia de estados nacionais, soberanos, autônomos, que podem (e devem) coexistir uns com os outros, através de alianças comerciais e culturais, intercâmbios, promovendo a liberdade de locomoção e, internamente, garantindo a seus respectivos habitantes os direitos que lhe são naturais e inalienáveis, como o direito à liberdade de expressão, de pensamento, de religião, direito à propriedade privada, etc. 

O que pensa a elite globalista anticristã e extremamente rica, com uma agenda própria e que tem sua própria ideia de civilização? Pensa o que aparece nas ações de homens e mulheres de influência, no cenário geopolítico, que são contra a propriedade privada e creem piamente que o mundo “só” pode alcançar um status melhor quando for governado por eles próprios. Nada, que não seja esse cenário, é satisfatório e, portanto, vale tudo. Vale destruir os paradigmas civilizacionais que nos criaram e, em cima dos escombros, construir outros. Isso leva tempo e é exatamente aí que entram os grupos que chamo de “cavalos-de-batalha” sociais, que apregoam conceitos estranhos de comunidade, liberdade, igualdade e da própria sociedade: uma comunidade em que as pessoas são niveladas por baixo; uma liberdade que consiste em não se ter liberdade alguma; uma igualdade que é mais igualdade para os que estão nas massas e uma diferenciação de modo de vida para os que estão na elite dominante e, enfim, uma sociedade rigidamente hierarquizada, controlada e dirigida como uma grande manada em direção ao curral.

11) Há anos estamos vendo a ascensão de movimentos de esquerda, dentro das universidades, como por exemplo Marxismo, Feminismo, etc. Nesse contexto, estão inseridos jovens cristãos que são pressionados a abandonarem sua fé em Deus e aderirem a tais ideologias. Na internet, tem crescido o número de jovens de cada vez mais são seduzidos por tais movimentos e se autoproclamam: “cristãos de esquerda’”. Diga-nos, é possível ser cristão e ainda assim ser adepto desse tipo de ideologia? Se não, porquê?

R – Pra mim, não é possível. Porque o marxismo é, desde sua origem, anticristão. Aliar marxismo ao cristianismo é o mesmo que querer que judeus sejam amigos dos nazistas. Marxistas se comprometeram com uma visão de mundo em que o que vale, na verdade, é transformar o mundo, custe o que custar, afim de se chegar àquele ideal que foi vaticinado por Marx e Engels, no século XIX. Já está dado no Manifesto Comunista, que um dos meios para que este fim, a utopia comunista, fosse alcançada, era que na luta de classes, o proletariado destruísse todos os valores de sua classe inimiga, a “burguesia”, que por sua vez era a protetora do cristianismo. 

Assim, o cristianismo, como qualquer religião, era o “ópio” do povo. O esquerdismo mundial sofreu inúmeras variações em várias áreas do saber, mas o ideal do comum permaneceu, levando agentes políticos e militares a produzirem as maiores atrocidades que o mundo já vira, e tudo para que se concretizasse aquele ideal imagético do século XIX. Na verdade, as sociedades totalitárias esquerdistas, como a russa e a chinesa, aderiram a um sistema em que o poder é um fim em si mesmo e que deve se perpetuar a qualquer custo. O resultado é a supressão das liberdades, o controle social rígido, com fortíssimas doses de engenharia social comportamental, o ateísmo e a propaganda megalômana de líderes que vendem um peixe podre à civilização. Agora, me pergunto: como pode um cristão, sabedor de toda essa desgraça em que se convertem as sociedades esquerdistas, radicais ou moderadas, ainda assim defender o esquerdismo?

12) Não poderíamos encerrar essa entrevista sem deixar de falar sobre suas contribuições tanto no meio acadêmico, quanto no eclesiástico. Como diretor e professor do Instituto Aliança de Linguística, Teologia e Humanidades, nos fale um pouco sobre o trabalho que essa instituição tem feito ao longo dos anos. O que ela tem a oferecer, quais projetos estão em desenvolvimento e quais avanços a instituição tem em andamento para o futuro?

R- O IALTH é um instituto que veio para deixar uma marca no cenário evangélico atual. Tem como missão, aliar o viés de formar obreiros para a Seara do Senhor Deus ao viés de instrumentalizá-lo academicamente, com o leque de informações necessárias para que o(a) aluno(a) tenha condições de dialogar com o nosso tempo. Isto em seus cursos-chaves, que são: Teologia, Missiologia e Capelania. O IALTH, hoje, Deus seja louvado, é o instituto de formação teológica que mais cresce na região do Grande Recife. Não tenho a menor dúvida de que este crescimento e fruto da bênção de Deus, pois há muito que o Nordeste do Brasil precisava de um centro de formação que teológica, interdenominacional e interconfessional, com um sólido propósito de fazer com que o(a) obreiro(a) aluno(a) seja uma bênção para seus líderes, sua igreja, sua comunidade. Além de munir o aluno de qualquer um desses cursos, que queira instrumentalizar-se no âmbito ministerial ou  apenas “crescer no conhecimento”, fazendo todavia com o objetivo de, se forem chamados pelo Senhor, poderem afirmar que foram capacitadas pelo IALTH.

Atenciosamente, Esquina da Teologia Pentecostal

27 de julho de 2018

A Cura Divina na visão do Teólogo Pentecostal Donald Gee


O texto que leitores terão acesso, na verdade é uma tradução inédita de um livreto, escrito pelo teólogo pentecostal Donald Gee, cujo titulo é ''“Eu deixei  Trófimo doente”- Nossos Problemas Com a Cura Divina. Gee escreveu este livreto quando os excessos e abusos dos "reavivamentos de cura" chegaram ao seu conhecimento, de modo que aqui estão reunidos seus pensamentos acerca da cura divina. Este livreto não foi muito popular em 1952, mas é uma contribuição pentecostal muito boa a esse assunto. Ele nunca foi publicado em Língua-Portuguesa e em Inglês está esgotado há muito tempo. Eu acredito que essa tradução irá abençoar a vida de muitas pessoas!

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“Eu deixei Trófimo doente”- Nossos Problemas Com a Cura Divina





Avancemos:

Este livreto foi escrito por alguém que acredita na cura divina para outros que também acreditam na cura divina.

É dedicado a esse grande número de homens e mulheres em todo o mundo que chegaram ao autor com seus problemas pessoais relativos à cura divina. 

Um desejo cada vez mais forte foi expresso de que algumas das coisas ditas em conversas íntimas podem ser publicadas em formato impresso. 

O resultado é este livreto. É publicado com desconfiança, mas com a sincera esperança de que possa ajudar os corações bons e honestos. Como ao autor foi concedido que visse a verdade, o único objetivo final é a glória de Deus através dessa verdade.

“Amado, desejo que te vá bem em todas as coisas, e que tenhas saúde, assim como bem vai a tua alma.”

Por Donald Gee 

“Eu deixei Trófimo doente em Mileto” (2 Timóteo 4.20).


Trófimo foi um cristão de Éfeso que se tornou um dos missionários que acompanharam Paulo durante suas últimas viagens. Muito provavelmente, ele foi convertido durante aquele notável período em que todos os que habitavam na Ásia, ouviram a Palavra do Senhor Jesus, tanto judeus como gregos, e Deus realizou milagres especiais através das mãos de Paulo: de modo que de seu corpo, foram levados lenços aos doentes ou aventais aos enfermos, e as doenças se afastaram deles, e os espíritos malignos saíam deles. (Atos 19: 10-12).

Quando Paulo finalmente partiu para a Macedônia e Grécia, Trófimo e Tíquico, outro asiático, o acompanharam. Eles retornaram com o apóstolo através de Troas, onde Trófimo deve ter estado presente naquela memorável noite de domingo no serviço de partir o pão, quando Êutico caiu do terceiro andar e foi levado a morte, mas foi restaurado a` vida pelo apóstolo. Poucos dias depois, quando o navio atracou em Mileto (ou Mileto), Paulo chamou os anciãos da Igreja em Éfeso para encontrá-lo lá, e Trófimo poderia muito bem ter estado em sua cidade natal. Mas ele viajou com o apóstolo todo o caminho planejado para Jerusalém, e foi a presença de Trófimo com Paulo nas ruas da cidade, que deu credibilidade ao boato de que Paulo tinha poluído o templo, ao ter levado seu companheiro gentio. (Atos 21: 29).

Então Trófimo involuntariamente, tornou-se o motivo para a multidão ter levado Paulo à prisão, com consequências gravíssimas. Parece improvável que Trófimo tenha acompanhado Paulo na viagem a Roma. Deve ter sido em uma jornada final, durante o breve período de liberdade de Paulo, entre a sua primeira e segunda carta a Timóteo, que ele deixou Trófimo doente em Mileto.

Esses detalhes narrados no livro de Atos são interessantes. Para nosso propósito atual, eles possuem significado em relação a cura divina porque provam que Trófimo havia contemplado com bastante frequência um ministério notável de milagres e esteve intimamente ligado a um missionário cristão que o exercia com notável sucesso e poder pentecostal.

Apesar de tudo isso, Paulo havia deixado Trófimo doente em Mileto. Mas porque ele fez isso? Seríamos ousados ao ponto de sugerir que Paulo perdeu seu poder para curar os enfermos no Nome do Senhor Jesus? Ou que Paulo havia perdido o dom e o chamado,  que foi visivelmente desfrutado por muito tempo? Ou que Paulo havia se desviado? Bem, não temos nenhuma evidência nesse sentido, pois, ao contrário disso, enquanto estavam ilhados em Malta na viagem a Roma, Paulo exerceu os dons da cura com grande poder e liberdade. (Atos 28: 8-9).

Nem podemos duvidar do desejo pessoal de Paulo de que esse fiel colaborador seja curado, em vez de ficar doente. A preocupação do apóstolo por Epafrodito em um caso semelhante, e seu profundo alívio quando Deus teve misericórdia dele, revelou o amor de Paulo por seus cooperadores, se por acaso a doença deixasse um deles para baixo (Filipenses 2: 25-30). Se pudesse ter sido possível pelas  orações de Paulo,  curar Trófimo, podemos ter certeza de que ele nunca o teria deixado doente. Atribuir isso à falta de disposição pessoal da parte de Paulo chega a ser monstruoso.

Um princípio importante que parece ser ilustrado aqui é que os dons de curar e operar os milagres (1Co 12: 9-10) têm sua verdadeira esfera no evangelismo, e não entre os santos. A Igreja comete um profundo erro quando tenta usar esses dons espirituais para si e não para os outros. Milagres de cura são sinais para seguir aqueles que creem ao pregar o evangelho a toda criatura (Marcos 16: 17-18). Sua eficácia para atrair e convencer os indiferentes e incrédulos aparecem repetidas vezes nas Escrituras. Nossa fé na cura divina acompanhando o evangelismo na linha de sinais-presentes como uma possibilidade graciosa para o nosso próprio dia, e até o fim dos tempos, tem sido notavelmente justificado por pregadores corajosos e fiéis, cujos enormes encontros deram a resposta impressionante àqueles que se perguntam como os homens ainda podem ser atraídos para ouvir o Evangelho. Acontece que curas não necessariamente convertem; elas não produzem necessariamente arrependimento para a vida; eles nunca assumem as funções relativas às “Escrituras e somente as Escrituras”; mas pelo menos, elas atraem  os homens para ouvir a Palavra que da vida.

O evangelismo é a sua verdadeira esfera, seja no primeiro século ou no século XX, e não um ministério geral de cura dentro das igrejasMuitos dos nossos problemas com relação à cura divina surgem porque não entendemos isso. Os discípulos se aglomeram em campanhas evangelísticas e se alinham com os pecadores e com os curiosos e necessitados que procuram uma participação na divina misericórdia para tal. Ninguém com qualquer simpatia por esses sofredores no corpo, irá criticá-los por buscarem alívio por qualquer meio. Às vezes, Deus graciosamente faz deles um sinal para os incrédulos, concedendo a eles um milagre de cura que todos possam ver. Mas se pensarmos bem, todos os que tiveram experiência com grandes “campanhas evangelísticas e de cura divina” vão notar que a maioria dos milagres de cura ocorrem sobre os que são atraídos pela primeira vez e não sobre cristãos membros fiéis de igrejas.

Além disso, Paulo não só deixou Trófimo doente em Mileto, mas não conseguiu alívio de suas próprias enfermidades físicas por meio de seus indubitáveis ​​dons espirituais. Há referências pungentes às suas próprias fraquezas físicas e enfermidades , sem falar naquelas de Timóteo, seu querido filho na fé (Gálatas 4:13: I Tim. 5:23). Paulo não apreciou suas fraquezas e enfermidades da carne; ele até orou para ser liberto delas, e sua glória final nelas foi uma notável vitória espiritual que era de uma ordem elevada da graça (2Co 12: 9-10). No caso de Timóteo, ele aconselhava dietas especiais para o seu alívio. O importante é que nem para si mesmo, nem para aqueles que eram membros de seu grupo missionário, ele praticava a cura divina através de dons sobrenaturais do Espírito, embora fosse ricamente dotado do mesmo em seu ministério evangelístico.    

Uma atenção mais atenta a esses fatos sugeridos pode lançar luz sobre alguns de nossos problemas sobre a cura divina quando, por exemplo,  vemos que aqueles que são muito usados ​​na cura de outros, mostram-se incapazes de obter cura para si mesmosNão precisa haver nada de inconsistente nisso quando vemos profundamente o suficiente. De fato, talvez haja algo profundamente verdadeiro e necessário nisso, pois, nosso Senhor não realizou milagres para Si mesmo, e o servo, não está acima de seu mestre. Provações, aflições e fraquezas  na carne de seus fiéis missionários e evangelistas hoje não são exemplos de fracasso na cura divina; em vez disso, podem ser marcas por compartilhar esse preço muito trabalhoso e pesado que a atividade do pioneirismo no Evangelho geralmente envolve. O esforço físico pode ser imenso, e há muitas evidências no Novo Testamento de que Paulo e seus companheiros passaram por isso.

Epafrodito não foi o último mensageiro do Evangelho que  por causa da obra de Cristo, chegou perto da morte. Saúde danificada é o preço que muitos pagaram. É o que deve ser evitado, tanto quanto possível, usando sabedoria, tomando precauções e, acima de tudo, mantendo a vontade de Deus e não tentando coisas além do nosso chamado pessoal. Deus teve misericórdia de Epafrodito, que aparentemente trabalhou demais para compensar a falta de serviço de outros (quantas vezes isso ocorre!), e Deus ainda tem misericórdia em circunstâncias semelhantes. Mas o preço tem que ser pago!  E às vezes, até a última medida completa de devoção. Se houver fracasso, não foi fracasso na cura divina. Talvez possamos entender naquele dia que não há fracasso algum, mas em princípio, apenas o resultado do nosso profundo trabalho, do que receber a libertação física que nossos corações fracos sempre anseiam e julgam ser a vontade de Deus.

Houve algum fracasso em Trófimo que exigiu que Paulo o deixasse doente em Mileto? Trófimo tinha sido culpado de alguma desobediência à vontade divina ou Trófimo simplesmente não tinha fé?

Aqueles que querem, de uma forma ou de outra, se encaixar neste verso sobre a doença de Trófimo, suas próprias doutrinas de cura divina são tentados a afirmar que ele deve ter falhado em algum destes pontos. Mas essa é a pior maneira possível de interpretar as Escrituras. Não há nada na declaração, ou em seu contexto, para sugerir qualquer coisa espiritualmente ou moralmente errada sobre Trófimo. Esse tipo de suposição aqui é completamente gratuita.

Parte da infeliz maneira pela qual a fé na cura divina, às vezes, tem sido sinceramente promulgada por personalidades fortes e de sugestões contínuas de que a incapacidade de ser curado está enraizada em algum fracasso espiritual profundo de alguém que está doente. Essa atitude acrescentou sofrimento mental ao sofrimento físico e, em casos extremos, transformou a crença na cura divina em um flagelo, em vez de um privilégio, e um fardo em vez de um alívio. Que possui um elemento de verdade não precisa ser negado. Mesmo na cura natural, o paciente tem responsabilidades. Mas, para manter uma doutrina da cura divina que age como um chicote sobre as suscetibilidades elevadas dos fracos e doentios, certamente chega perto de ser uma caricatura de compaixão com a qual nosso Senhor viu as multidões de pessoas doentes que se aglomeravam à sua volta na terra.

Que haja confissão de todas as falhas conhecidas; que haja humilde oração por luz em qualquer obstáculo à cura que a obediência possa remover; que a fé seja fortalecida pelas promessas da Palavra de Deus e pelos testemunhos daqueles que foram curados divinamente; mas que tudo isso seja feito em amor. E em todo o tempo, tenham cuidado com as astúcias do acusador dos irmãos, (Apocalipse 12:10), sabendo que Satanás acrescentará aflição a um filho de Deus, a menos que seja resistido pela verdade como foi no caso de Jesus. Se nenhuma razão aparente para o fracasso em receber a cura sobrenatural ficar clara para a consciência ou mente do sofredor, não temos outro recurso senão deixar o caso nas mãos de nosso Pai Celestial, sem condenação de nós mesmos ou dos outros. Deixemos  o nosso Trófimo ser mantido sem culpa, embora tenha ficado doente, até sabermos como somos conhecidos.

Trófimo estava doente. Esse simples fato é declarado sem comentários. A Bíblia é um remédio salutar para doutrinas mórbidas ou extremas que se recusam a ver a vida claramente e como um todo. Quando se registra o milagre, há uma restrição e simplicidade que constitui uma marca registrada da veracidade. Somos nós que, no calor de nossas controvérsias, ou nosso mero descuido na leitura, que frequentemente perdemos o fundo consistente e sólido do que normalmente acontece na Bíblia. Mas, no pano de fundo dos primeiros cristãos, era perfeitamente normal no que diz respeito à experiência humana universal.

Algo tremendo aconteceu em suas almas, e eles sabiam disso! Tudo era possível para eles através da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos. Eles nasceram de cima e seus corpos se tornaram os templos do Espírito de Deus. Sua pregação de Cristo foi confirmada com sinais seguindo, e suas reuniões foram marcadas por manifestações sobrenaturais do Espírito Santo. Eles se confessaram estranhos e peregrinos com uma cidadania no céu. Mas seus mestres os exortaram a serem diligentes para cumprir todos os deveres regulares e normais da vida doméstica e familiar, da vida social e empresarial, da cidadania terrena e da obrigação moral (por exemplo, Colossenses 3:17, 4: 1). Eles conheciam o nosso comum riso humano e lágrimas, força e fraqueza, pobreza e abundância, trabalho e descanso, sol e sombra. Eles se casaram e foram dados em casamento. Eles tiveram filhos e conheciam a angústia do luto quando aqueles a quem amavam morriam - apenas eles eram ensinados a considerar isso como adormecer em Jesus, e recebiam uma bendita Esperança (1Ts 4: 13-18).

Pode parecer ridículo ter que afirmar o fato claro de que, mais cedo ou mais tarde, todos aqueles primeiros cristãos de quem lemos no Novo Testamento morreram. O milagre pelo qual Pedro restaurou Dorcas à vida (Atos 9:40) não foi repetido indiscriminadamente, se é que aconteceu. Isso significa que os entes queridos não eram continuamente ressuscitados dos mortos, por mais profunda que fosse a tristeza e grande a perda para a igreja local.

Podemos, se preferirmos, imaginar que a grande maioria dos que não se tornaram mártires simplesmente morreu durante o sono, ou desapareceu por pura velhice, ou de alguma outra forma sonhadora que se esvaiu dessa vida sem dor para a vida que é vindoura. Talvez tenha sido assim. A ideia é atraente. Se isso for verdade, significa apenas que, aqueles primeiros cristãos tiveram uma experiência anormal em morrer que eles não tinham em viver. Para a maioria dos homens e mulheres comuns, a morte chega no final por algum fracasso físico do qual eles não se recuperam - uma doença se mostra fatal, por causa dos poderes prejudicados da resistência física através de anos avançados. Isso nos pressiona a acreditar que o Novo Testamento não tem o hábito de impor a nós que imaginemos que era completamente diferente com os primeiros cristãos apenas porque eles eram cristãos. 

É perfeitamente natural que todos nós queremos evitar a doença, a morte e nossos medos; esse tipo de  aversão nos faz apoderar-se avidamente de uma doutrina que nos ofereça algum tipo de imunidade. Por razões semelhantes, há muitos cristãos que amam a doutrina do que é geralmente chamado de "arrebatamento", muito mais porque lhes oferece a ideia de escapar da morte do que pelo arrebatamento genuíno pelo qual teremos de ver o Seu rosto abençoado. As doutrinas da cura divina que quase não deixam lugar ideal na vida do cristão devido à dor física e fraqueza, muitas vezes são compreendidas com avidez, mas este é o desejo que nem a experiência cristã, nem a Bíblia quando corretamente interpretada, podem transmutar em sã doutrina que suportará a tensão que inevitavelmente é chamada a suportar na vida prática. Não me admira que estejamos cercados de problemas com relação à compreensão da cura divina, pois nós os criamos para nós mesmos formularmos doutrinas imperfeitas.

É útil esperar saúde e sempre uma força suficiente para fazer a vontade de Deus e viver para a Sua glória. Acontece que os cristãos na Bíblia não eram uma multidão de gente doentia, sempre em busca de orações por cura corporal. Nem suas assembleias locais eram pouco mais do que clínicas de cura divina. Temos o direito em Cristo de esperar as bênçãos de uma salvação que tenha um lugar em sua santificação para o corpo, bem como para o espírito e a alma (I Ts. 5:23). Um corpo saudável é uma bênção imensa que acreditamos que os cristãos podem justamente reivindicar e estimar pelo serviço de amor a Deus e ao homem.

A saúde física é frequentemente uma questão de obedecer a leis simples e naturais da saúde, como por exemplo, a alimentação e a ingestão de bebidas; roupas sensatas; ar fresco e bons exercícios; horas adequadas de sono; um bom equilíbrio de trabalho e recreação; liberdade de preocupações pessoais; etc. Ao atender esses assuntos, estamos fazendo nossa parte na verdadeira santificação dos templos do Espírito Santo. Nosso Pai Celestial nos ajudará a alcançar aquilo que é anormal somente quando não tivermos absolutamente nenhuma alternativa em cumprir nosso dever, mas quebrar temporariamente as leis da saúde. Isto é, chegam os momentos em que os riscos precisam ser tomados; quando o sono tem que ser negado; quando comida inadequada tem que ser comida; quando temos que trabalhar temporariamente demais; e quando a ansiedade e os cuidados pessoais dificilmente podem ser evitados sem ser erroneamente antinatural. Confiar em Deus, para depois ser preservado na saúde, é privilégio de seus filhos; mas abusar das regras comuns para um corpo saudável quando não há necessidade de fazê-lo é pura presunção, e precisamos ter pouca surpresa se pudermos sofrer em conformidade com isso. A cura divina não nos dá privilégio de sermos presunçosos.

E é fanático descartar todo lugar para uma possível doença e, finalmente, se Deus permitir, uma doença até a morte. Afirma-se com discurso perfeitamente claro que, no final de sua vida, o grande profeta do Antigo Testamento, Eliseu, ficou doente da doença da qual morreu, (II Reis 13:14) e o contexto não dá a menor indicação de que ele fracassou espiritualmente. Pelo contrário, ele parece cheio de energia espiritual e profética até o fim. Mas, à maneira do fim de sua vida terrena, ele era, em flagrante contraste com seu antecessor, inteiramente normal e como todos os outros homens. Nós, que vivemos nesta dispensação, desejamos ter um êxodo como Elias, em vez de Eliseu, mas desejos e doutrinas são assuntos diferentes - ou pelo menos deveriam ser. 

Será que Trófimo pediu aos líderes da Igreja que orassem sobre ele e o ungisse com óleo no Nome do Senhor, para que ele pudesse ser restaurado da sua doença (Tiago 5: 14-15)? Bem, se Paulo podia pedir aos líderes da Igreja em Éfeso que viessem a ele em Mileto para um propósito muito diferente, não haveria dificuldade alguma em fazer a mesma curta jornada em resposta a um apelo de Trófimo. Sendo assim, pode ser possível que ele tenha se comunicado e os anciãos o ungiram (só que isso não nos é dito.) e aparentemente, Paulo não tinha ouvido falar de sua cura quando escreveu a Timóteo sobre sua doença.

A passagem bem usada na Epístola de Tiago estabelece uma injunção clara sobre o que os cristãos devem fazer se ficarem doentes. (Incidentalmente, ele reconhece a doença como uma possível contingência entre os crentes.) Eles devem fazer uma abordagem espiritual do assunto. Seu primeiro chamado deve ser para seus líderes espirituais, e não para seus assessores médicos. Isto é, deve haver oração e uma unção sacramental com óleo que não tenha valor ou propósito médico. Uma oração de fé é chamada para salvar os doentes e a referência no contexto da oração de Elias pela chuva (Tiago 5: 17-18) indica que a intensidade espiritual pode ser necessária. A cura divina através da unção e oração não é assunto simples para se envolver casualmente ou superficialmente. Ligado a isso, existe uma referência a` procura para o perdão dos pecados, e uma confissão mútua de falhas, acompanhada de oração mútua para cura. O ministério dos anciãos não fica sozinho; é apenas uma parte da ordenança.

A passagem inteira de Tiago foi banalizada ao ser usada de maneira muito promíscuaEla não ensina um apelo dos anciãos aos doentes para que recebam a oração; mas ensina um apelo dos doentes aos anciãos. E isso significa “aqueles que estão gravemente doentes”, não “aqueles com queixas triviais e menores que não os impediam de participar da reunião da igreja local”. A palavra significa literalmente “sem força” ou “exausto’’ e é usada em conexão com Lázaro, Dorcas e Epafrodito, todos os quais eram mortalmente doentes. Tais têm que ser visitados porque a doença é grave.

Unção com óleo não é “extrema unção” para os moribundos; é um ministério para preservar e prolongar a vida através da cura divina. Mas deve ser exercido nos casos  graves, de séria necessidade, e parece mais adequado quando feito na privacidade do lar e na enfermaria do que o desfile em público de orações pelas queixas menores ou íntimas dos corpos dos crentes, às vezes para o nosso constrangimento. Se tivermos uma forte reverência para esta ordenança sagrada, ela tenderá a aumentar a fé em sua eficácia e respeito pelos Anciãos que a realizam.

Uma promessa graciosa coroa a instrução de Tiago: “O Senhor o levantará.” É impensável que tal palavra pudesse encontrar um lugar no Novo Testamento sem que essa realização abençoada ocupasse um lugar comum entre os cristãos. Eles adoeceram como outros homens, mas foram curados pelo Senhor. Suas respostas às muitas outras orações sobre os outros assuntos encontraram uma contrapartida nas respostas à oração pela cura também. Nós também podemos nos gloriar nos muitos e muitos cristãos hoje que podem testemunhar graça semelhante ao receber a cura divina diretamente do Senhor em resposta à oração, e muitas vezes, depois da obediência a esta admoestação escriturística de pedir aos Anciões locais que os ungissem com óleo e orassem sobre eles em Seu nome.

No entanto, uma doutrina completa deve levar em conta todo o conselho de Deus revelado em Sua palavra. É nossa fraqueza comum dar pouca ou nenhuma atenção a passagens das Escrituras que falham em apoiar nossas doutrinas favoritas. Vejamos então: Se a cura definitiva do Senhor chegou a Trófimo, como nos é dito que chegou a Epafrodito, então deve ter sido adiada. Talvez houvesse algumas condições espirituais que Trófimo precisou cumprir, mas devemos seguir com muito cuidado, por menor que seja a insinuação,  pois, Paulo não sugere nenhuma, embora o tenha feito claramente no caso dos muitos fracos e doentes entre os coríntios (1 Coríntios 11:30). Também, aparentemente, Dorcas não tinha chamado os Anciãos em Lida  (Atos 9:38) para que orassem por ela e a ungissem com óleo, a menos que seu ministério não se mostrasse eficaz, ou então a menos que levemos em consideração  a visão extremada de que sua morte foi deliberadamente ordenada por Deus para permitir que Pedro realizasse o milagre. Paulo não parecia procurar a ajuda do ministério de nenhum líder para o ungir por suas próprias enfermidades, e no caso de Timóteo, ele aconselhava o cuidado com a dieta em vez da oração. Se desejarmos, podemos até supor que na cura que veio a Epafrodito, os Anciãos de Roma haviam orado por ele, mas não nos é dito nada sobre isso nas Escrituras. Finalmente, devemos nos lembrar mais uma vez, correndo o risco de repetir o óbvio, que cedo ou tarde todos os primeiros cristãos morreram. Nenhuma observação de Tiago v. 14-17, por mais escrupuloso que fosse, impediu o curso da natureza. Portanto, é claro que sua aplicação deve ter algumas limitações, se estivéssemos mais dispostos a reconhecer que podemos dispor de alguns dos nossos problemas com relação à cura divina. Mas será que Trófimo reivindicou a cura divina? Ao fazer essa pergunta, abordamos o que será o cerne da questão para muitos crentes devotos e sinceros, e precisamos buscar sabedoria para pisar com cuidado para não prejudicarmos a fé de ninguém.

Pregadores da cura divina geralmente enfatizam que a cura deve ser “tomada” ou então “reivindicada” no nome do Senhor, sem qualquer discernimento no que diz respeito a ser a vontade de Deus para curar. Por eles, isso é considerado resolvido além de qualquer sombra de dúvida, desde que aquele que está doente esteja preparado para confirmar certas condições claramente estabelecidas. Qualquer questionamento quanto à vontade de Deus para curar é tratado com suspeita impiedosa como abrigando dúvida e incredulidade, e o candidato a cura é exortado a recusar isso em qualquer lugar no coração ou na mente. Vamos admitir imediatamente que essa atitude ajudou muitos, pois a fé envolve um ato da vontade e uma confiança fundamentada das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem (Hb 11: 1).

A fé tem que tomar a cura como um direito a ser reivindicado no Nome do Senhor, quaisquer que sejam as aparências externas. Há algo de esplêndido nisso e os genuínos milagres da cura divina recompensaram essa fé inabalável, mesmo depois de uma batalha prolongada. Mas para aqueles mais fracos na fé e na personalidade, isso pode ser muito difícil, desanimador e desconcertante. Tal atitude impõe um tremendo fardo se não houver uma fé pessoal pronta para assumi-la, venha o que for.

Uma base doutrinária para a “concepção da cura divina como inquestionavelmente na vontade de Deus para todos” foi desenvolvida pela maioria das denominações pentecostais em suas declarações oficiais de fé. Ela toma a forma de doutrina de que “a cura divina tem sido fornecida na Expiação” (Assembleias de Deus britânicas). As Assembleias de Deus americanas acrescentam as palavras ‘úteis e são o privilégio de todos os crentes”. Já as Igrejas Elim declaram isso de forma um pouco mais ambígua, como dizem:

“Acreditamos que nosso Senhor Jesus Cristo é o Curador do corpo, e que todos os que andarem em obediência à Sua vontade podem reivindicar a cura divina para seus corpos.’’

Isso enfatiza condições a serem cumpridas:  “obediência”, mas carrega o mesmo pensamento de uma reivindicação. Uma verdade importante e poderosa é incorporada nessas declarações, com sua referência escriturística a Isaías 53: 4-5 interpretado sob a autoridade de Mt. 8: 16-17, e que os poucos que amam a mensagem da salvação não podem negar. Mas que precisamos da sabedoria que somente o Espírito da verdade pode dar em sua aplicação igualmente evidente. Pois bem, afirmar que a cura para nossos corpos repousa sobre uma autoridade idêntica com a cura para nossas almas na obra expiatória de Cristo nosso Salvador pode envolver sérios problemas de fé pessoal e confiança para aqueles fracos na fé se, e  principalmente quando, eles veem casos manifestos onde a cura divina, embora seja "reivindicada", não tenha sido recebida. É inútil nos cegarmos ao fato de que tais casos existem. A fé verdadeira se recusa a cegar-se para a verdade e a doença persistente pode ser uma verdade muito desagradável e teimosa.

A doutrina da cura divina para o corpo na Expiação atinge seu valor máximo quando a doenç a física é o resultado de nosso pecado pessoal. Nesse caso, traz alívio indescritível ao sofredor para este ver que o sangue de Cristo compra não apenas perdão pelo pecado, mas a libertação de seus maus resultados no corpo – “o castigo de nossa paz estava sobre ele; e pelas suas pisaduras somos curados.” Levados literalmente por muitas multidões, isso os ajudou muito e lhes permitiu ter fé para serem curados. Deus seja louvado!

A fervorosa pregação da Expiação ocasionalmente sugere a verdade de que às vezes, o amor e a sabedoria divina permitem uma medida de sofrimento como resultado do pecado, a fim de nos ensinar a não pecar mais, e nos fazer amar a justiça e odiar a iniquidade. O exemplo clássico é Davi, que, embora perdoado por sua iniquidade, teve que sofrer pelo resto de sua vida por causa disso (II Sam. 12: 13-14; 13:31; 25:14, etc.). Uma doutrina da “cura divina vindo como resultado do trabalho da Expiação” deve consistentemente deixar um lugar semelhante para a doença permitida como um método de amor e sabedoria divina para propósitos de castigoA consideração da enfermidade como um castigo (isto é, disciplina) de nosso Pai Celestial foi indubitavelmente muito exagerada, e tem sido uma desculpa para muita descrença, mas pior e mais louco que isso, é negar toda a verdade em uma atitude para com a doença que os cristãos experimentam através dos tempos e que tem  sido consistentemente sustentadaNo entanto, sempre que a disciplina cumpriu seu propósito, sua necessidade cessa. Sendo assim, o reconhecimento da doença como método de punição divina não destrói uma doutrina verdadeira da cura divina, mas sim a fortalece.

No caso de Paulo e seu famoso espinho na carne não houve remoção, apenas uma explicação satisfatória (2 Coríntios 12: 7-9). Não foi castigo, mas sim um severo preventivo contra o fracasso espiritual que teria arruinado seu ministério adicional. Era um caso inteiramente pontual e excepcional, e nunca deveria ser citado, a não ser por aqueles que se atrevem a conceber a si mesmos como em perigo semelhante de alma através da abundância de suas revelações. Onde eles estão?

A doutrina de que, uma vez que a doença está na raça humana como resultado da queda, e que a obra expiatória de Cristo proporciona livramento total aqui e agora é atraente e lógica. Agora, a medida precisa de nossa atual libertação de todos os efeitos da queda, seja na alma ou no corpo, é uma questão sobre a qual deve haver uma discriminação cuidadosa.  Neste ponto aqui, alguns parecem ter se desviado um pouco da doutrina da santidade e uma falácia paralela ataca as doutrinas da cura divina. Graças a Deus que, para o futuro eterno, não há dúvida de nossa perfeita redenção; e agora temos isso potencialmente em Cristo.

É na aplicação pessoal ao cristão que cai doente que nossa doutrina da doença, como resultado do pecado, pode ser chocantemente mal aplicada e mal interpretada. Apressadamente atribuir a doença pessoal ao pecado pessoal era a loucura precisa dos três amigos de Jó que atraíam sobre eles a ira do Todo-Poderoso. Muitas coisas cruéis ainda estão sendo ditas em linhas similares por expoentes apressados ​​e ditatoriais de doutrinas muito imperfeitas sobre a cura divina. Geralmente, são aqueles que sofreram pouco, ou então tiveram apenas uma experiência de cura divina em apenas uma linha, sobre a qual baseiam todas as suas ideias. Sendo assim, é apenas no sentido mais amplo que podemos ensinar que a doença na raça humana deriva do pecado na raça.

Pedidos extravagantes de imunidade da fraqueza física e da dor aqui e agora serão corrigidos, se observarmos as palavras como aquelas usadas por Paulo em Romanos 8: 16-25 e II Coríntios. 5: 1-5. Embora os cristãos tenham os primeiros frutos do Espírito, eles ainda gemem dentro de si esperando a adoção, a saber, a redenção do corpo. Tais passagens efetivamente dissipam as alegações arejadas e fanáticas de alguns que eles estão desfrutando até agora, seus corpos de ressurreição. A verdade escriturística é que os santos mais seletos da terra ainda têm momentos em que gemem, desejando ser vestidos com a nossa casa que é do céu. O ensino destas passagens não é uma alegação de cura divina da causa do gemido ou suspiro conseqüente às enfermidades da carne, mas sim ter o conforto da esperança de que há uma vida mais plena, e um corpo bem feito, em vez de uma “tenda” esperando por nós na vida por vir.

A doutrina de que a libertação da enfermidade, pela cura divina, é prevista na Expiação é baseada seguramente em um fundamento escriturístico, mas precisa ser interpretada à luz de toda a Palavra de Deus. Aplicá-lo indiscriminadamente e cegamente é mergulhar multidões de pessoas boas em problemas graves. É significativo lembrar que as Epístolas aparentemente não as apliquem ao problema da doença humana atual e às enfermidades da carne, nem mesmo em Tiago 5: 14-16, onde o trabalho da Expiação só pode ser assumido como uma base para a oração da fé. Nossos problemas com relação à cura divina nos impõem em responsabilidade por um exame corajoso e franco das aplicações que fazemos de nossas doutrinas, embora não precisemos questionar os fatos básicos estabelecidos em nossas declarações de fé.

A doença inexplicável de Trófimo, e toda a doença inexplicável entre os cristãos, nos leva finalmente ao problema final da dor no Universo. Não podemos negar isso! Não podemos contrair o Universo como o encontramos, mesmo depois do supremo fato histórico do Calvário. Continua sendo um dos mistérios finais da existência, como a conhecemos atualmente, que Deus, que é amor, mas permite a dor.

A Bíblia não oferece uma explicação fácil. O mais sábio entre nossos mestres nunca pretende nos oferecer mais do que uma solução parcial do problema. Está lá e não podemos escapar disso. Contudo, a Bíblia ensina que nosso Pai Celestial usa a dor para fins amorosos de disciplina. Ela nos conforta com a promessa de que certamente virá um tempo em que não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem haverá mais dor.(Apocalipse 21: 4). Acima de tudo, a Bíblia revela que Deus em Cristo sofreu a dor, e de alguma forma mística ainda sofre com a gente. Pois nos é dito que embora Ele fosse um Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que Ele sofreu (Heb. 5: 8). É verdade que, exceto pelo cansaço causado pela jornada (João 4: 6), nosso Senhor parece ter gozado de perfeita saúde quando estava na Terra. Mas desde que Ele sofreu a dor de uma natureza mais profunda, cremos que nosso Sumo-Sacerdote também conhece o sentimento de nossas enfermidades físicas (Hb 4:15). Qualquer doutrina da cura divina que professa não deixar lugar para a dor na ordem atual das coisas é palpavelmente superficial demais para ser verdade. Pode ter um apelo passageiro para o impensado, não pode suportar a tensão da vida como ela realmente é no universo de Deus e por fim, produz problemas artificiais e desnecessários, recusando-se a enfrentar o verdadeiro problema. Para o genuíno problema da dor, há pelo menos o genuíno conforto da verdade. Já para os nossos falsos problemas, não pode haver conforto verdadeiro.

Parece que, em última análise, fazemos nossos próprios problemas de cura divina por causa de nossa tendência inveterada de empurrar qualquer verdade revelada a nós a extremos. Tornou-se um truísmo que quase todo erro é uma verdade que foi levada para longe demais. Todavia, na cura divina, vislumbramos através da graça de Deus uma verdade brilhante e salvadora.

A Igreja tem uma dívida que ela nunca poderá pagar aos corajosos pioneiros que não amaram suas vidas até a morte para que ela possa se estabelecer novamente como parte do Evangelho. E uma dívida igual é devida àquelas denominações que tiveram ousadia para incluir uma declaração de sua fé na cura divina em seus princípios, e então passaram a ensinar e praticar esse ato entre seus adeptos. Não só já ganhamos tremendamente nessas coisas, mas louvado seja Deus, que o avanço continua.

Se for perguntado se essa verdade foi levada ao extremo, pode-se sugerir que, em primeiro lugar, erramos ao recusar qualquer lugar em nossa doutrina, ou pelo menos damos um lugar muito insuficiente, à vontade soberana de Deus. Ao pedir a cura divina sem qualquer acompanhamento, no entanto, do “não a minha vontade, mas a tua ser feita”, parece colocar uma atitude fora de acordo com todas as outras atitudes corretas que tomamos em oração.

E em segundo lugar, parece que recusamos sem razão qualquer lugar para a cura física, ser ministrada a nós na vontade de Deus, exceto por meios inteiramente sobrenaturais e milagrosos. É necessário expressar-se com grande cuidado neste ponto, pois toca a devoção e o zelo de muitos companheiros de fé escolhidos. Seu corolário aceito por sua fé na cura divina parece ter sido um firme repúdio do uso de qualquer meio natural de cura que seja inconsistente com a fé. Acontece que a ajuda de medicina ou cirurgia, e a assistência de médicos ou enfermeiras, tem sido desaprovada e denunciada nos termos mais fortes. Algumas dessas almas sinceras literalmente morreram por sua fé porque se recusaram a se comprometer no assunto.

Para outros de nós, parece razoável confiar em Deus para a cura de nossos corpos de uma maneira que não necessariamente e arbitrariamente exclua qualquer pensamento da Divina Providência e amor sendo ministrado a nós através de intermediários humanos, e por meio da habilidade naturalmente adquirida na arte da medicina. Nossa fé em Deus em outras questões, como, por exemplo, provisão para todas as nossas necessidades, não nos impediu de ver a mão de nosso Pai Celestial no ministério dos canais humanos - mesmo dos ímpios. Ao exigir um milagre absoluto, toda vez que adoecemos, deixa parecer que muitos de nós estamos no limite da presunção.

Podemos até apreciar o estabelecimento de um testemunho do poder de cura sobrenatural de Deus para Seus filhos, além do uso de meios naturais de cura aceito, pois  isso tem sido suficiente para alguns de seus filhos deliberadamente recusar todo recurso a esses meios. De nenhum outro modo, tal testemunho poderia ser demonstrado. Mas para transformar esse chamado pessoal em uma doutrina radical para a Igreja é um assunto muito diferente e sério. Isto é, ensinar que todos os cristãos que acreditam que existe um lugar para a cura divina são desviados e falham na fé, a menos que tomem uma atitude extrema contra o recurso a meios para a cura é colocar sobre a maioria dos verdadeiros filhos de Deus um jugo que eles não são capazes de suportar.  Até mesmo as multidões que subscrevem um princípio denominacional expressando crença oficial na cura divina, na verdade, recorrem em tempos de necessidade de cura e alívio da dor, para vários remédios naturais e habilidade da profissão médica.

Para aliviar a consciência de um fracasso para inconsistências, seria um serviço profundo para muitos cristãos sinceros que possuem a integridade mental e espiritual como sendo da maior importância. Mas se uma posição doutrinária radical é considerada insustentável na prática, exige uma modificação ou revisão apropriada. Se for considerado necessário retê-lo em sua forma verbal em nome de um testemunho, então um lugar honroso deve ser permitido para aqueles que estão preparados para subscrevê-lo com uma reserva de seu direito de julgamento privado em sua aplicação precisa a si mesmos. .

Se é verdade que a confiança em Deus como o Curador de Seus filhos, automaticamente os impede de todos os múltiplos e misericordiosos meios de cura que a ciência médica torna universalmente disponíveis, então a doutrina da cura divina incorpora um privilégio duvidosoMas nosso Pai Celestial não é um tirano assim, quando os Seus próprios adoecem, e Seus filhos sabem agradecer-Lhe a glória quando são curados de qualquer maneira que Sua providência considere adequada.

Uma doutrina mais sadia da cura divina, ou pelo menos uma aplicação mais sadia e proclamação da verdade, seria um caminho muito longo para resolver a maioria dos nossos problemas no assunto. Nós formulamos nossos próprios problemas porque o Todo-Poderoso nem sempre faz o que nós, em nossa pressa ou em nossas ideias imperfeitas, pensamos que Ele deveria fazer. E somente uma posição doutrinária que a experiência torna sustentável pode manter a lealdade voluntária daqueles que a professam, e salvá-los da negação moralmente prejudicial na prática daquilo que eles afirmam acreditar na teoria. A negação prática da cura divina na prática, por multidões que ainda professam crer nisso como um princípio de sua fé, pede exame honesto e uma expressão mais perfeita daquilo em que realmente acreditamos.

Por fim, pode bem ser que, na declaração insignificante de que Paulo deixou Trófimo doente em Mileto, temos uma daquelas afirmações intencionais da Bíblia que pretendiam nos impedir de extremos, visto que o apóstolo que se manifestou quando estava em companhia deste amigo e cooperador, tais milagres extraordinários de cura também enfrentaram o mistério da doença entre seus associados íntimos. Para tais mistérios, ele tinha apenas uma resposta: ‘Agora conheço em parte; então, conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido.”

Nessas grandes palavras de fé está o eterno triunfo da fé, da esperança e do amor. Ainda que, às vezes, tenha que ser dito ao Senhor, aquele a quem ama está doente. A resposta final aqui, e daqui por diante, será fornecida por Aquele que é a ressurreição e a vida. Todavia, aqueles que encontraram o Cristo vivo para estar aqui e agora o Curador Divino encontraram uma pérola da verdade que ninguém lhes tirará.



                                                 (A foto acima é do livreto de Gee impresso).
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O livreto em língua inglesa pode ser encontrado no formato de foto-cópia em: http://www.sermonindex.net/modules/articles/index.php?view=category&cid=615

Tradução: Everton Edvaldo.