7 de outubro de 2016

A INCONSISTÊNCIA DO "APELO IRRESISTÍVEL" - UMA REFLEXÃO BÍBLICA


por Everton Edvaldo



Introdução: A prática de convidar o pecador para vir à frente da congregação para "aceitar Jesus" se tornou comum na maioria das igrejas evangélicas. Os historiadores consideram Charles Finney (1792-1875) como “pai do apelo”. Atualmente, essa prática tem sido feita muitas vezes de forma equivocada. Pretendo mostrar nesse artigo alguns equívocos envolvidos, e na medida do possível, uma solução para o problema. Boa leitura!

I- HORA DO APELO: UM CONVITE É FEITO.

Biblicamente falando, não é equivocado convidar pecadores para vir à Cristo. O próprio Jesus proclamava isso: "Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei.Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve." (Mt 11.28-30). As pessoas devem vir à Cristo porque ele é a provisão salvífica de Deus para todos os perdidos. Ele é o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (Jo 1.29).

Esse convite pode ser feito sinceramente para para todos os homens e em qualquer lugar, conforme pregou Paulo em Atenas: "Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, e em todo o lugar, que se arrependam." (At 17.30).

Diariamente, pessoas não salvas, vão para as igrejas. Algumas motivadas pela graça preventiva, chegam na igreja desejosas de ouvir a Palavra de Deus. Outras, vão apenas para assistir o culto, ou por mera religiosidade. Temos aí uma ótima oportunidade para lhes anunciar a mensagem da salvação e lhe convidar para vir à Cristo. Durante o culto, a mensagem é pregada e geralmente no término da mensagem o convite é lançado. Desde já quero frisar que o apelo em si, não é antibíblico, nem equivocado. Veremos isso mais adiante. Agora veremos o que acontece na esfera espiritual quando o convite é feito.

Do lado divino, uma coisa extraordinária está sendo feita. Enquanto está sentada no banco e ouvindo a mensagem, a trindade está atuando através da graça, na vida daquela pessoa. O pregador é apenas um instrumento de Cristo, pois só quem convence o homem do pecado, da justiça e do juízo é o Espírito Santo. (João 16.8). Entretanto, mesmo sendo alvos da graça de Deus, muitas pessoas resistem ao Espírito Santo (At 7.51) rejeitando assim a oferta da salvação, enquanto outras respondem positivamente não resistindo à graça de Deus, sendo salvas por Ele.

II- OS EQUÍVOCOS:

É aí que entra os equívocos na hora do apelo. Muitas vezes, o pregador fica "forçando" o ímpio a se entregar a Jesus, como se ele só tivesse essa opção. É importante ressaltar que a maioria dos pregadores não fazem isso com má intenção. O pregador faz isso porque deseja que aquela pessoa se arrependa dos seus pecados e creia no evangelho. Entretanto, a boa intenção não justifica o apelo irresistível. O convite deve ser lançado, porém não devemos forçar ninguém a crer em Deus. Até porque não temos o poder de fazer isso. Deus tem o poder de "converter as pessoas irresistivelmente", porém não age dessa forma. Ele não quer ninguém forçado, mas de forma espontânea e voluntária. A graça de Deus capacita todo e qualquer homem a não resistir ao chamado de Cristo, contudo, muitas pessoas não dão ouvidos a isso e é por isso que não são salvas.

Ficar "apelando irresistivelmente" não é uma prática sensata, muito menos ética. Disse o Senhor a Zorobabel: "...Não por força nem por violência, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor dos Exércitos." (Zacarias 4:6). Se a pessoa não quer, não devemos forçá-la. Quando se tenta forçar alguém a se entregar a Jesus algumas coisas acontecem, como por exemplo: ímpio se sente pressionado, ouvindo o pregador chamá-lo exaustivamente por vários minutos. Geralmente essas pessoas não voltam à igreja, por não se sentirem à vontade.

Além disso, essa postura é deselegante, cansativa e constrangedora. Precisamos respeitar as decisões das pessoas, e não só isso. Devemos entender que muitas vezes, a mensagem da cruz não foi pregada. Como um pecador irá se arrepender dos seus pecados e crer no Evangelho, se Cristo não lhe foi pregado? Não veremos almas se rendendo a Cristo, se alimentarmos seus ouvidos com mensagens antropocêntricas, materialistas e vazias. A fé vem pelo ouvir a Palavra de Deus! (Romanos 10.17).

É bem verdade que existe uma batalha espiritual no momento do convite, porém quando o pecador não resiste à graça de Deus, nada lhe impede de ser convertido. Isto, porque é o próprio Deus que está lhe atraindo. Veja o que Jesus disse em João 6.44: "Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, não o atrair; e eu o ressuscitarei no último dia."

III- DUAS OBSERVAÇÕES:

Dois fatos interessantes devem ser observados:

O fato de o pecador ter ficado no banco, não significa que ele não tenha crido. Muitas pessoas são tocadas pela mensagem, são salvas, porém não se levantam na hora do apelo. Devemos entender isso, pois a condição estabelecida por Deus foi esta, "a saber: Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo." (Romanos 10.9).

Outro fato interessante que merece ser observado, é que nem todos que atendem ao apelo, apresentam uma conversão sincera e autêntica. Muitos vão para frente da igreja por mero emocionalismo. Já vi casos de pessoas irem à frente, só para satisfazerem a insistência do pregador. O pregador insiste tanto que a pessoa se dirige à frente da igreja não por desejo próprio, mas pela insistência dele.

Sendo assim, o apelo irresistível é inconsistente com a teologia a qual professamos e por isso deve ser evitado. Não faz sentido crermos que graça é resistível e na hora do apelo, tentarmos forçar as pessoas a se arrependerem. Se a graça é resistível, nada mais lógico que o convite também ser resistível.

Conclusão: Após abordar as questões acima, gostaria de propor uma prática coerente e bíblica. O apelo deve ser feito normalmente, no máximo três vezes (não é regra) e o pecador deve vir livre e espontaneamente à frente da congregação para professar que Jesus é o Senhor e receber a oração da igreja. Que isso não seja feito com gritos, nem com ameaças, pois pode afastar ainda mais o pecador do evangelho. A nossa tarefa é de fazer o convite. Caso o pecador responda positivamente à graça de Deus, será de grande proveito para o reino de Cristo. Porém, se a pessoa não quiser, a nossa postura deve ser de respeito e prudência. Feito isso, o pregador pode expressar que o desejo de Deus é que aquela vida seja salva, e que as portas da igreja estarão abertas para lhe acolher. Dessa forma, a sabedoria de Deus vai se manifestando em nosso meio e o seu nome vai sendo glorificado. Amém!